A bicicleta grande está na cozinha; não tivemos forças para a guardar no canto dela. Já bastou erguê-la em braços para descer os dois andares quando a senhora lavava as escadas e nos olhou com ar reprovador: “Não se preocupe, senhora com ar reprovador. Quando regressar a estas escadas a tresandar a lixívia vou voltar a menosprezar as minhas hérnias, e nem uma roda tocará no chão.”
Saímos às dez e voltámos às duas. A roupa que usámos ficou ensopada e ensurrada. Percorremos quilómetros a fazer corridas, a subir e a descer passeios. Fomos ao supermercado em Odivelas, à ótica no Lumiar, a três parques diferentes ora num ora noutro lado. Andámos com as bicicletas no metro, subimos e descemos pontes, subimos e descemos viadutos. Descobrimos na Quinta das Conchas uns escorregas em ziguezague que fazem lembrar o aquaparque e um comboio misturado com os baloiços. Fizemos um piquenique para aguentar até ao almoço. Fizemos lasanha quando chegámos a casa. Comemos a lasanha à bruta e demos de comer à toalha (como é que é, mãe, o molho de tomate sai com fairy?). Saltámos a sopa.
Um dos dois (que não é rapaz) precisava mesmo de uma sesta. Acordámos às cinco, fomos para a Caparica. Tomámos banho de mar no outono, fizemos um túnel onde cabia a retroescavadora e brincámos na areia até ao Sol se pôr. Outro piquenique nas escadas da esplanada a ver as ondas. Fomos ver a ponte que suporta a linha do comboio que percorre as praias e andámos a passear nos carris. Vimos mosquitos à nossa volta e sentimos umas picadelas. Soltámos qualquer coisa sobre estarmos a gostar mesmo deste dia. Em casa, tomámos um duche juntos e cada um tratou das babas do outro com Fenistil. Jantámos a falar com os primos de Leiria pelo Skype. Lemos DOIS capítulos do dicionário por imagens do corpo humano em vez de um. Pedimos mais um mano. Um dos dois (que não é rapaz) rebolou a rir com a pergunta. Ouvimos o Carlos Paião e cantámos a Cinderela aldrabada (“ela corou um pouquinho e respondeu baixinho sou uma panela”). Rimos muito e vimos onde cada um tem cócegas. Parámos quando estávamos a fazer muito barulho. Contámos a história do Henrique que tinha um comboio que levava os meninos às praias. Fechámos a luz. Precisámos de voltar à casa de banho duas vezes, de trocar de T-shirt uma e tivemos frio primeiro e calor a seguir. Há 20 minutos que adormecemos.
Tenho oito mordidas de bichos (uma delas na testa), a canela esfolada, dois arranhões grandes na coxa, pernas, braços e costas a doer, e areia por todo o apartamento. Mas voltava a fazer tudo outra vez.
Amanhã talvez fiquemos por casa.
(Publicado no meu facebook em 24 de outubro de 2014)