Texto referente à instalação Words for gardens (2006/07), de Luísa Cunha (versão portuguesa da autora), retirado do livrete Pode o museu ser um jardim?, Obras da coleção de Serralves, 06 fev - 13 set 2015.
terça-feira, 17 de fevereiro de 2015
palavras para jardins.
Não consegues desenhar. Dizes que não consegues desenhar. Gostarias de conseguir desenhar. Vês. Vês coisas. Vês pessoas. Vês pessoas movendo coisas. Vês pessoas movendo pessoas. Vês coisas que não se movem de modo algum. Vês coisas movidas por pessoas. Vês coisas que se movem sem notares. Tu notas que elas se moveram mas só algum tempo mais tarde. Elas estiveram a mover-se todo o tempo. Regressas e elas estão mudadas. E então dizes: “Elas cresceram.” E elas continuam a crescer sem que o vejas. E regressas mais tarde. Tu então vês que elas já lá não estão. E dizes: “Elas desapareceram.” Relva. Consegues desenhar relva. Em infindáveis folhas de papel. Começando onde quiseres. Não interessa. Indo para onde quiseres. Não interessa. Tocas a superfície do papel com um movimento rápido e intenso da tua mão. Para no ponto de toque. Apercebes-te do que acabaste de fazer e dizes: “Eu desenhei um ponto. Eu estou agarrado a este ponto. Para onde vou daqui?” Segue numa direção qualquer. Deixa que a intensidade do teu gesto se esbata deixando para trás uma curta linha ligeiramente curva que se vá esbatendo. Desenha outro ponto intenso. Deixa-o esbater-se ao longo de outra linha ligeiramente curva que se vá esbatendo ao longo de outra linha ligeiramente curva agora projetada noutra direção. E outro ponto ao longo de outra linha noutra direção qualquer. E outro ponto e outra linha outra vez noutra direção. E outra vez e outra vez e outra vez. Olhas. E dizes: “Está a crescer.” E vais em todas as direções. Intercetando as curtas linhas ligeiramente curvas que se esbatem e surgem de pontos intensos plantados por toda a parte. E dizes: “A relva está a crescer depressa.” Então paras por um momento. Olhas para a relva no chão e dizes: “Há um espaço livre aqui.” E enche-lo de relva. Depois notas outro espaço vazio deste lado e outro daquele lado e depois outro à esquerda e outro à esquerda e outro a sul e um outro a sudeste. Vais continuando a plantar relva até o chão ficar todo ele coberto. Observas a paisagem. E então dizes: “Está tudo verde e macio."
Texto referente à instalação Words for gardens (2006/07), de Luísa Cunha (versão portuguesa da autora), retirado do livrete Pode o museu ser um jardim?, Obras da coleção de Serralves, 06 fev - 13 set 2015.
Texto referente à instalação Words for gardens (2006/07), de Luísa Cunha (versão portuguesa da autora), retirado do livrete Pode o museu ser um jardim?, Obras da coleção de Serralves, 06 fev - 13 set 2015.
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