sexta-feira, 29 de maio de 2015

balanço.

Trinta e seis dá para ter menos de quatro quilos e mais de noventa. Para cabelos loiros, castanhos, pretos, acobreados, listados, arroxeados. Raízes à mostra e brancos. Pôr extensões e tirar extensões. Duas vezes. Dá para arrancar milhares de pelos das pernas uma e outra vez, uma e outra vez, uma e outra vez. Ao longo de anos. E ficar com peladas. Dá para partir a cabeça e ser operada. A fingir, no quarto dos miúdos, e a sério. Para agarrar a barriga, para não ter barriga, para mostrar a barriga, para a encolher. Para caras feias e sorrisos amarelos. Dá para cáries, dores de cabeça, comichão nas axilas, sardas, arranhões e feridas. Dá para cortar os dedos com a faca trinta vezes. Ou mais. Dá para pintar a cara com maquilhagem e esferográficas. Para ouvir ralhetes e ralhar, levar e dar palmadas. Dá para pedir, inventar, ouvir, aceitar e engolir desculpas. Esfarrapadas e das boas. Dá para gostar e para não gostar da forma do nariz, das orelhas, das pernas. Dá para beber milhares de litros de água e para morrer de sede. Dá para perder o embalo. E o autocarro. E o metro. Por um triz ou por muito. Dá para ganhar coragem, para falar, para calar, para gritar. Tanto.

Trinta e seis dá para errar e para acertar em cheio. Para ser enganada, endrominada, surpreendida, assustada, beliscada, ajudada, amada, tão amada. Dá para ter e fazer cócegas. Para parir. Para ter medo. Para escorregar. Dá para apanhar azeitonas, cerejas, maçãs, pêras e romãs. Equilibrada numa só perna. Dá para ser fotografada a ler na árvore. Para comer mais do que a conta e para ter fome. Torcer o nariz ao almoço da mãe e pensar em milhares de pratos que os miúdos podem ou não gostar. Dá para queimar o jantar. Noventa e sete dietas. Centenas de chocolates.

Seis sobrinhos, cinco patrões, quatro avós, três casas, dois irmãos, um afilhado, zero abortos. Dezenas de sustos, namorados, medalhas de minimaratonas. Uns quantos acidentes e umas quantas mortes.

Trinta e seis dá para ser traída, para desconfiar. Para o arrependimento. Profundo. Para contar histórias e inventar. Para ler livros, saltar páginas. Guardar segredos. Sorrir. Chorar.

Trinta e seis anos dá para tudo.

Sem comentários:

Enviar um comentário